A questão do diagnóstico é um ponto fundamental de qualquer disciplina clínica e/ou terapêutica. Ele assenta num conjunto de conhecimentos acerca da psicopatologia e referencia uma determinada entidade patológica conhecida por intermédio de critérios cuja relação com a patologia em causa se considera relevante, significativa ou mesmo patognomónica. A elaboração de um diagnóstico implica um trabalho rigoroso de avaliação, interpretação e conhecimento do paciente e a sua importância não deve ser descurada. Contudo, por vezes acarreta consequências cuja gravidade iguala ou excede a da própria patologia, pelo que a sua utilização e divulgação devem ser, sempre, consideradas e tidas em conta.
O diagnóstico é útil? Sem dúvida. Para o clínico, a elaboração do diagnóstico consiste num ponto de orientação, uma referência fundamental para o trabalho terapêutico. Com efeito, antes de se decidir para onde se quer ir, é necessário ter consciência de onde se está. Todo o trabalho clínico com o paciente deve ter em conta, sempre, o seu modo específico de funcionamento mental, a sua organização da personalidade, o seu tipo de angústia, mecanismos de defesa predilectos, nível de organização do Ego, jogo inter-sistémico e principais conflitos. Pela minha orientação dinâmica, considero que o diagnóstico deve ser, sempre que possível, um diagnóstico estrutural, psicanaliticamente formado, que condense em simultâneo não só a patologia que afecta o doente mas também o seu quadro de organização personológica que o sustém. Além disso, o diagnóstico é principalmente útil no âmbito da investigação e da comunicação entre clínicos de diferentes países e referenciais teóricos; apenas com uma determinada homogeneização conceptual é possível comunicar com diferentes pessoas acerca de uma (considera-se) mesma coisa. Mais, várias vezes torna-se claro que o diagnóstico é útil também para o paciente. Existem muitas pessoas que sofrem acrescidamente pela ignorância daquilo que os afecta. Sentem necessidade de saber. Esse saber confere-lhes, em alguns casos, uma sensação de domínio sobre si mesmos e o que os afecta, o que é de inolvidável valor terapêutico. Assim sendo, se o clínico julgar a priori benéfico para o paciente dar-lhe conhecimento do nome daquilo que o afecta, ele deve fazê-lo. Caso o clínico pressinta que o conhecimento do paciente só o fará aterrar depressivamente ou imergir num sentimento de culpa ou vergonha, ele então deverá considerar o real valor terapêutico dessa tomada de conhecimento, por muita necessidade que o paciente tenha em saber.
Quanto aos limites da formulação diagnóstica, esses prendem-se principalmente com as consequências muitas vezes gravíssimas que acarretam. Erros ainda mais crassos acontecem na clínica infantil, onde por inúmeras vezes os clínicos se esquecem da maleabilidade e mutabilidade do funcionamento psíquico da criança catalogando-o com uma facilidade assustadora de diagnósticos que acarretam conotações pesadas de gravidade e cronicidade. Não raras vezes se encontram crianças com 11 ou 12 anos com uma interacção social e vida emocional sadias que aos 4 ou 5 receberam um diagnóstico de autismo ou síndrome de Asperger. Também na adolescência se assiste facilmente a surtos psicóticos provocados por substâncias ou desorganizações mais ou menos insólitas (ex: bouffés délirants, psicoses canábicas, tóxicas) que auferem desde logo um diagnóstico extremamente pessimista de esquizofrenia. Sempre que o diagnóstico seja derrotista, isto é, que preveja apenas cronicidade ou um processo mórbido de degeneração ele deve ser evitado ou substituído por outro que contenha uma conotação mais mutável e menos encarceradora, sempre que possível (o caso das disarmonias evolutivas na clínica infantil é disso exemplo). É claro que existem verdadeiras esquizofrenias, psicoses maníaco-depressivas e autismos, e nestes casos também pouco há de bom em criar no paciente e na sua família expectativas demasiado altas que possam facilmente cair por terra. Contudo, na maioria dos casos e principalmente na clínica infantil diagnostica-se demasiado facilmente e de ânimo leve sem a mínima consciência do impacto que o nome de uma doença psíquica provoca no narcisismo e na integridade da pessoa.
Em todos os casos, o psicólogo deve pôr a questão da utilidade clínica do diagnóstico e assegurar-se de que o faz ou comunica apenas quando acreditar que isso seja benéfico para o paciente, evidentemente, se essa decisão couber apenas a si.
2 comentários:
Sou um estudante "frustrado" de psicologia, e ao navegar pela net encontrei por acaso o seu blog que considero deveras interessante, de qq modo apesar de considerar a psicologia como altamente nefasta para mim, dei o lado fraco a ao longo de tres anos e meio de estudos na area tenho de dizer com coragem e determinaçao que a considero inutil na practica clinica tipicamente nas orientaçoes psicodinamicas e cognitivo comportamentais; sempre considerei que quando a psicologia em portugal atingir a dimensao que possui nos estados unidos entao ai somos uma naçao condenada, e pq? Pq à menor contrariedade da vida vai-se ao psicologo e as pessoas tornam-se incapazes de resolver os seus dilemas de ordem psicologica que, sejamos francos a maior parte das vezes sao minimos de magnitude.
Um individuo, tem valor nao pelo diz e faz, mas pelo modo como sente o que diz, faz o que faz e reflecte sobre o feito e o que esta por fazer, apostemos na educaçao civica e pessoal para criar pessoas determinadas que nao vacilam contra as verdadeiras provações, as quais so os ditos seres superiores conseguem superar ou aceitar(morte, doença, perda).
Quiça aqui no Brasil as pessoas pudessem ir aos seus menores desenganos a um psicólogo...As grandes dores aqui faem parte de um cotidiano ao qual já acostumamos
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