quarta-feira, setembro 27, 2006

Uma (As)Simetria Secreta

Irei falar aqui de um aspecto histórico da psicanálise do qual conheci a existência há pouco tempo atrás. Ele é, curiosamente, um facto não tanto ligado à história do movimento psicanalítico mas mais dos seus intervenientes, embora tenha constituído um passo talvez determinante para a evolução do pensamento psicanalítico, nomeadamente o jungiano. Farei aqui uma resenha muito breve daquilo que li na minha principal fonte: «Viena de Freud e outros Ensaios» de Bruno Bettelheim, Bertrand Editora. Aproveito para aconselhar vivamente a leitura deste livro, incluíndo o capítulo «Uma Assimetria Secreta», que descreve com a excelência reconhecida a este autor um acontecimento tão excitante como importante na compreensão da história da psicanálise.

Bettelheim baseia-se num outro livro: «Diário de uma Simetria Secreta» de Aldo Carotenuto, na sua versão brasileira. Neste último o autor italiano analisa uma documentação inédita: a correspondência entre Carl Jung, Sabina Spielrein e Sigmund Freud. Apesar de existirem algumas discordâncias entre Carotenuto e Bettelheim, a descoberta fundamental permanece a mesma.

Sabina Spielrein foi uma das primeiras doentes de Jung enquanto este trabalhava no mundialmente famoso Hospital Psiquiátrico de Burghölzi. Foi este caso «clínico» que incentivou Jung à primeira correspondência com Freud e que iniciou o contacto entre ambos. Nesta primeira carta Jung descreve «uma estudante russa, de 20 anos», dizendo que se trata de «um caso complicado» e que necessita (ele, Jung, e não Spielrein) «de fazer a sua catarse». Este é o início de uma história triangular extremamente interessante, com contornos de amor e traição. Mais tarde, a própria Spielrein tornou-se psicanalista e publicou trabalhos importantíssimos, dos quais se destaca o primeiro artigo (ainda antes de Freud) acerca da dualidade pulsional: amor e destruição.

Acredita-se que Sabina terá sido a musa inspiradora de Carl. Os conceitos jungianos de «anima» e «sombra» são oriundos ou da própria Sabina, ou da relação entre ambos, e como estes uma grande parte da teoria de Jung poderá ter tido exactamente o mesmo seio.

De carácter cinematográfico tenho conhecimento de duas fontes: um documentário intitulado «Meu Nome era Sabina Spielrein», de Elisabeth Márton (2002); o filme «Jornada da Alma» (tradução brasileira) do cineasta italiano Roberto Faenza.

Mais não digo, para espicaçar a curiosidade. Trata-se não só de uma interessantíssima história de amor (não do género romântico), mas também da história da própria Psicanálise.